(Mais) um eu perdido

Abriu os olhos para a manhã chuvosa. Quis fechá-los novamente. Desejava nunca tê-los aberto. Afinal, por que abri-los se não podia enxergar? Começava a perceber sua infinita insignificância. Apenas uma, nada, tanto faz. E um mundo inteiro lá fora, de braços abertos, esperando uma alma corajosa penetrá-lo além do tempo. O tempo vívido, insensato, voraz. A rotina quase lhe impedia de respirar. Queria pensar, mas não podia. Certa vez nem mesmo queria, seria assaz doloroso. De repente, cansa. Livros, revistas, sites, filmes, teatros, artes, paisagens, viagens, pessoas, filosofias, informação, reflexão, paixão. Queria tudo e mais um pouco, dotada de um sentimento de incompletude. A desilusão de não poder. O biopoder apoderando-se em si. O "si", sempre impotente, fica em casa enquanto ela sai pra trabalhar. Mais uma. Esforça-se para admirar as pequenas coisas em meio a tanta irritação, frustração. A incessante busca pela sensação de estar vivendo. Medo de perder tempo. Receio de deixar a vida passar desapercebida. O ofício, a música, os estudos, as relações, as leituras, a psicanálise. Autoconhecimento? Questionamento! Podia ser apenas o fim, mas sempre queria mais. Mais. Muito mais. Tanto, que desejava não querer. Pior, temia não mais saber querer.

Comentários

  1. As manhãs chuvosas transformam-se rapidamente em pensamentos densos.

    Mas não fique triste, pois viver, viver ainda é terno.

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