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Mostrando postagens de julho, 2009

(Mais) um eu perdido

Abriu os olhos para a manhã chuvosa. Quis fechá-los novamente. Desejava nunca tê-los aberto. Afinal, por que abri-los se não podia enxergar? Começava a perceber sua infinita insignificância. Apenas uma, nada, tanto faz. E um mundo inteiro lá fora, de braços abertos, esperando uma alma corajosa penetrá-lo além do tempo. O tempo vívido, insensato, voraz. A rotina quase lhe impedia de respirar. Queria pensar, mas não podia. Certa vez nem mesmo queria, seria assaz doloroso. De repente, cansa. Livros, revistas, sites, filmes, teatros, artes, paisagens, viagens, pessoas, filosofias, informação, reflexão, paixão. Queria tudo e mais um pouco, dotada de um sentimento de incompletude. A desilusão de não poder. O biopoder apoderando-se em si. O "si", sempre impotente, fica em casa enquanto ela sai pra trabalhar. Mais uma. Esforça-se para admirar as pequenas coisas em meio a tanta irritação, frustração. A incessante busca pela sensação de estar vivendo. Medo de perder tempo. Receio de de

À la recherche

Depuis que tu es parti je suis triste Plus que triste: une autre Plus triste: seule. Depuis que tu es parti je veux le monde Plus que le monde: moi Plus moi: toi. The Velvet Underground - Pale Blue Eyes

Beleza, por Milo Manara

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"A beleza é um conceito difícil de explicar, pelo menos para mim. Mas vamos usar como exemplo um quadro muito famoso de Van Gogh, Os Comedores de Batata . A cena representa uma situação de extrema pobreza e miséria. Os personagens têm corpos representados com bastante feiura, deformados por um trabalho muito rígido. Estão vestidos com trapos e sua mesa miserável é iluminada com a luz vívida de um lampião. Os tons são escuros e esverdeados, tudo menos belos. Por quê? Vamos pegar outro exemplo. Existe um quadrinho muito famoso chamado Maus , de Art Spiegelman. Ele conta a história terrível do holocausto dos judeus nos campos de extermínio. Para contar aquela história, Spiegelman usou animais no lugar de humanos, fazendo com que ela parecesse ainda mais atroz. Os judeus são representados como ratos e os agentes da SS como gatos. Mas não são gatos e ratos desenhados como Walt Disney faria, o desenho é sujo, estranho, sem nenhuma elegância, e nós ainda dizemos que é um quadro belíssimo

Chuva em Jorge Amado

Proust e Flaubert não conheceram a Bahia. Talvez por isso eles tenham sido escolhidos para me acompanhar. Férias na terra do axé me lembram Bandeira em Pasárgada. Acarajé, tapioca, creme de cupuaçu, suco de cajá, doce de banana da terra, capeta, casquinha de siri, moqueca, picolés. Uma nova fonética se abre aos ouvidos; tentações ao paladar. E de que valem Proust e Flaubert na terra de Jorge Amado? Espera-se um tempo de sol, bonito, aberto, feliz. No entanto, a tristeza consegue contagiar até mesmo a Bahia. Foi trazida pelos franceses. Ainda assim, encontra-se um aconchego no Restaurante Gabriela, em frente ao Bar do Vesúvio, entre o mar e a catedral. No país do carnaval, na Bahia de todos os santos e tantas Gabrielas, Tietas, flores, tantos sertões, maridos, orixás, um poeta abre as portas de sua casa para receber os passantes. Fugidos da chuva, escondem-se sob o teto amarelo e descobrem na Bahia um pedacinho de cultura. Cultura do povo, proveniente da sorte. Sorte trazida pelo acaso

Lembrança de Itacaré-BA

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O inspetor não gostava de viajar. Queria ter uma rotina, ver sempre as mesmas pessoas, sentir-se confortável com seu eu-comum, sem ter que lidar com o desconhecido. Porém a profissão lhe obrigara a viajar constantemente. Conheceu o Barão e então a viagem fez sentido. ( O Barão , Branquinho da Fonseca). Há quem viaje para esclarecer a sensação de pertencimento ao mundo, para se encontrar no outro, para sentir que está compartilhando a vida com o todo. Eu sempre gostei de viajar, mesmo sem saber ao certo a razão. Gosto de me sentir próxima da minha família em nossas viagens de férias; gosto de descobrir diferentes modos de vida, de entrar em contato com o "eu" ao longe e senti-lo perto. Gosto de me surpreender! Sinto-me, todavia, estranha. Não pertenço a esse lugar. Também não pertenço à minha casa, nem à minha terra. Tão pouco me pertenço. O que eu vim buscar aqui, afinal? Fugir da minha vida, sim, me agrada. Mas gostaria, acima de tudo, de fugir de mim mesma. Outrar-me. It